terça-feira, 13 de junho de 2017

Tanta água

Para o pai que não mora com os filhos, utilizar as férias para um passeio em uma estância termal parece uma ótima opção. Assim Alberto (Néstor Guzzini) parte com o casal de pré-adolescentes em busca de um estreitamento na relação com as crianças.

O imprevisto já aconteceu com boa parte das famílias que esperaram ansiosamente por uma viagem inesquecível nas férias: dias de chuva torrencial. A metáfora na história das diretoras Ana Guevara e Leticia Jorge se refere à limpeza, algo que mudará na vida dos personagens como um rito de passagem com a purificação da água.

A irritação típica e inevitável é o que rende as primeiras cenas de comédia. Não há ‘plano b’ que alivie o tédio de quem esperava por dias de diversão à beira da piscina e encara um quarto fechado, sem muitas opções de distração e sem uma mísera televisão para ajudar a passar o tempo.

Sendo o adulto responsável Alberto, poderia ter mais maturidade para lidar com a situação adversa, porém ele também é o principal encarregado de uma viagem bem sucedida. Não bastasse a frustração evidente pelo tempo chuvoso, Alberto percebe que os filhos já não são crianças que se entretém com qualquer coisa. O senso crítico parece deixar a situação incontornável.

Frederico (Joaquín Castiglioni), o filho mais novo, prefere fazer novos amigos e andar de bicicleta pela colônia de férias do que fazer visitas guiadas pelas usinas e fábricas da região. Ele não menospreza o esforço do pai, nem nega sua atenção. É somente um interesse na diversão imediata ao invés de um passeio em família que, apesar de repleto de boas intenções, não poderia ser mais divertido que brincar com outros de sua idade.

Já a filha mais velha, Lucía (Malú Chouza), começa a entrar na adolescência e qualquer que seja a situação já tenderia a se afastar do cuidado paterno. Aquele aparente tédio constante que ronda os adolescentes é compreensivelmente agravado pela chuva e pelas condições de uma viagem não muito atrativa.

Não temos muitas informações sobre a vida dos três personagens antes da viagem, mas sendo as férias uma oportunidade de aproximação, as descobertas podem ser frustrantes para todos os lados.

É muito natural que Alberto fique frustrado ao ver sua paternidade muito mais dispensável do que ele esperava, ficando irritado ao perceber que não conseguirá ser o provedor de felicidade que tanto gostaria de ser aos filhos. Não se trata apenas da viagem de férias. Alberto vive o momento em que se dá conta de que os filhos ensaiam os primeiros passos de independência.

A apreensão do pai também é justificável. Não basta se acostumar com a ideia de ver os filhos independentes, mas de medir as responsabilidades paternas em uma fase delicada, sobretudo quando Lucía já não quer andar de bicicleta com outras crianças, mas sair sozinha com pessoas desconhecidas.

Alberto não quer adotar o perfil linha dura, talvez influenciado pelo fato de passar pouco tempo com os filhos e não querer cultivar uma imagem negativa nas oportunidades que tem junto a eles, ao mesmo tempo, aos pais nunca é fácil equilibrar a liberdade concedida e o receio por conta da inexperiência dos filhos.

Diante do novo, cada um a seu modo, os filhos irão se machucar. É inevitável e necessário que isso aconteça. O desafio de Alberto, como de qualquer pai, é saber quando intervir para reduzir os danos. Não é tarefa fácil e cabe lembrar que a dificuldade também é grande para os filhos.

Assistimos ao filme com o olhar de quem já passou pela adolescência e consegue ver os problemas com a devida distância, porém Lucía começa a entrar em uma fase da vida em que ser rejeitada em um círculo social é uma situação inadmissível. Sem ter abandonado completamente a infância e ainda longe de uma maturidade para lidar com situações cotidianas, ainda que desagradáveis, o apoio do pai pode ser benéfico.

Entre erros e acertos Alberto tem o mérito de enfrentar suas inseguranças como pai e arriscar na tentativa de preparar os filhos para o mundo. Sua dedicação e boa vontade têm efeito em um círculo restrito e não existe controle total quando os filhos saem de casa. É um momento delicado em que os papéis, dele e dos filhos, ainda não estão bem definidos. Se os erros são inevitáveis, fica interessante abordá-los em tom de comédia.


Nenhum comentário:

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...